Coluna do Corvo

Fé no volante, mas com freio

Começa em Foz do Iguaçu a semana de celebração a São Cristóvão, padroeiro dos motoristas. Missas temáticas e reflexões ocuparão a Paróquia São Paulo Apóstolo até domingo. O Brasil, no entanto, segue como um dos países mais letais no trânsito. São 35 mil mortes por ano, com tendência de alta. Fé ajuda, mas não substitui revisão nos freios, cautela na direção e respeito à vida. A bênção celestial é bem-vinda e certamente conscientiza mais que as campanhas de trânsito.

 

Carreata da fé e o custo da imprudência

A carreata de São Cristóvão deve reunir cerca de 4 mil participantes em Foz. Vans, caminhões, carros e até bicicletas receberão bênçãos pelas principais avenidas da cidade. Um gesto bonito, mas contrastante com o cenário real: segundo o Ipea, acidentes de trânsito custam mais de R$ 50 bilhões por ano ao país. O trauma é coletivo. Os hospitais lotam, o SUS sangra e as famílias padecem. O maior milagre seria transformar devoção em responsabilidade nas ruas. E isso ainda está longe de acontecer.

 

Motocicletas: o risco que o Brasil insiste em ignorar

As motos viraram solução econômica para muitos — e pesadelo para os hospitais. Em 2023, mais de 70% das internações por acidentes graves envolveram motociclistas. A imprudência de condutores e a falta de estrutura urbana alimentam esse drama. São Cristóvão pode até proteger, mas o que falta mesmo é capacete, respeito ao limite de velocidade e fiscalização eficaz. Um país que não cuida do motociclista é o mesmo que sobrecarrega o sistema de saúde e enterra pais de família.

 

A festa, o churrasco e o Brasil real

Ao fim da procissão, a tradição: costelões, saladas, arroz, mandioca e ação entre amigos com prêmios tentadores, como moto 0km e TV de 50″. Mais que fé, a festa é símbolo de união comunitária. Mas a euforia termina no portão da igreja. Lá fora, há motoristas que esperam que o santo corrija quem vem em sentido contrário.

 

Lata velha, cabeça quente

Muitos veículos no Brasil circulam sem condições mínimas: pneus carecas, freios vencidos, faróis improvisados e licenciamento atrasado. Mesmo assim, são guiados como se estivessem em Interlagos. A devoção a São Cristóvão vira amuleto contra o descaso mecânico. Enquanto isso, o sonho de reforma cai nas mãos da caridade televisiva — ou do milagre. O problema é que carro ruim não reza. E quem está ao volante, quando mistura descuido com arrogância, transforma fé em estatística.

 

O general e o mapa da mina

O prefeito General Silva e Luna voltou a Curitiba para mais uma rodada de pedidos junto à Secretaria Estadual da Saúde. Entre os pleitos: mais repasses, novos leitos de UTI e ampliação do Poliambulatório. Já é a enésima missão à capital — com direito a ofício carimbado e até planta arquitetônica na mochila. Se continuar nesse ritmo, o prefeito acaba trocando a residência oficial pela vizinhança do Palácio Iguaçu. Quem sabe não pinta até uma placa na porta: “Gabinete Avançado de Foz”.

 

Estratégia de guerra (pacífica)

Em meio a pressões regionais, o prefeito levou reforço: secretário de Saúde, de Comunicação e assessor especial. Beto Preto ouviu os pedidos e prometeu avaliar os pleitos com atenção. Foz argumenta com razão: cidade de fronteira, polo turístico, embora não seja o hospital faz a função “regional”. E no fim a conta não fecha. A impressão é que o município cuida da saúde de meio mundo com orçamento da cidade. A guerra é justa, falta é munição.

 

Plantão capital

Quem acompanha os informes da prefeitura já entendeu: o prefeito passa mais tempo em Curitiba do que em algumas secretarias da cidade. A agenda de saúde exige presença, insistência e diplomacia — e nisso o General tem sido incansável. A ideia é transformar o discurso em repasses, promessas em UTIs e reuniões em estruturas reais. Enquanto isso, a população tenta encarar o atendimento. Porque quando o buraco é na saúde, não basta oração e suspensão de veículo reforçada. Precisa de verba, leito e respirador funcionando.

 

Vai e volta com escalas técnicas

A rotina do prefeito à capital já é operação de ponte aérea. Embarca com pedidos, volta com promessas. A peregrinação tem razão de ser: Foz é sobrecarregada por pacientes da região, turistas, fronteiriços e até gente que só vem para o remédio. Mas sem reforço financeiro, o que era peregrinação vira procissão. Curitiba por enquanto escuta. Falta a entrega.

 

O equilibrismo na esquina

Como escrevi no início da semana, no cruzamento em frente ao Restaurante China, entre um sinal vermelho e outro, tem artista que desafia a gravidade e o bom senso — e sai ganhando nos dois. Monta corda, sobe, gira tocha e ainda sorri para os turistas. E antes que alguém pense em buzinar indignado, o contra-almirante Paulo Tinoco, chefe da segurança municipal, já respondeu: “ao menor sinal de sirene, o rapaz desmonta o picadeiro em tempo recorde”. Dizem que passou pelo “Cirque du Semáforo”. Em Foz, o trânsito às vezes engasga — mas o talento flui.

 

Picadeiro urbano

Foz do Iguaçu é um verdadeiro circo a céu aberto — no melhor sentido. Tem palhaços; malabaristas; poetas de semáforo, músicos e artista plástico que troca tela por parede. Estátuas humanas respiram devagar, e tem até quem faça embaixadinha com três bolas. Não é bagunça, é expressão. Pesquisa recente mostra que a maioria da população aprova. O cenário é bonito — e o espetáculo é de graça.

 

Cataratas no horário nobre again

Marcos Mion volta a exibir mais uma edição do Caldeirão direto das Cataratas do Iguaçu. Desta vez, o cenário é o primeiro mirante da Trilha das Cataratas: a natureza já faz a pós-produção. Tem música, onça de pelúcia dando pistas no “Sobe o Som” e roteiro que passeia por Itaipu, Marco das Três Fronteiras e até por águas binacionais. Se Foz tivesse um crachá na Globo, já estaria carimbado como “elenco quase fixo”.

 

O Caldeirão ferve na fronteira

No episódio anterior, Marcos Mion tomou banho de cachoeira com Lucio Mauro Filho e Gil do Vigor — enquanto o Roupa Nova cantava e o Globolinho balançava o topete. Agora, vem aí a segunda rodada da série de quatro programas gravados entre julho e agosto. É Foz em rede nacional, com sua biodiversidade, turismo e alma de show. Tem gente que diz que a cidade virou o novo “Projac da mata atlântica”. Se continuar assim, vão gravar novela com título tipo “Coração das Águas” ou “Amores em Três Fronteiras”.

 

Foz, figurante de luxo da TV brasileira

Quem acha que arte em Foz se limita a grafite de muro e malabarismo no semáforo, precisa ligar a TV. A cidade virou locação queridinha da Rede Globo. E com razão: tem cenário cinematográfico, logística eficiente, apoio institucional e, claro, um público fotogênico. A parceria entre o Parque Nacional, o ICMBio e a Urbia Cataratas tem dado conta do recado — e a produção do Caldeirão tem se aproveitado disso com inteligência. Resultado? Um Brasil inteiro assistindo Foz com olhos encantados e, quem sabe, preparando as malas para as férias.

 

Carta à Redação: Justiça sob pressão

Prezado editor, escrevo movido por inquietação e, sobretudo, pela responsabilidade cívica de manifestar opinião sobre um tema que vem afligindo grande parte da população brasileira: o estado atual do nosso Judiciário. O faço depois de ler a sua coluna.

Nos últimos tempos, o que antes era visto como o fiel da balança entre os poderes, tem assumido posturas que ultrapassam o campo técnico da justiça e adentram o terreno da política e da influência social. De cortes superiores aos juizados especiais, o que se observa é uma crescente sensação de distanciamento da realidade, excesso de protagonismo e uma estrutura muitas vezes inacessível, cara e ineficiente para o cidadão comum.

Não são raros os relatos de decisões que parecem desconectadas do bom senso e da vida concreta das pessoas. A sensação de que há interferência indevida em dinâmicas sociais que poderiam ser resolvidas com diálogo — e não com sentenças — é cada vez mais presente. Julgamentos por amostragem, assessores com poder decisório e longas esperas transformam o direito em um labirinto.

É legítimo afirmar que a crítica se estende à condução de figuras públicas com protagonismo elevado no cenário jurídico nacional. Não se trata de personalizar o problema, mas de apontar o quanto o poder de um único magistrado pode, em determinados contextos, ultrapassar os limites saudáveis do equilíbrio entre os poderes.

Não se trata de negar a importância do Judiciário, nem de colocar em dúvida sua necessidade em uma democracia. Pelo contrário. Mas é urgente repensar sua atuação, sua abertura ao diálogo e sua sensibilidade diante das demandas da sociedade. Afinal, se o Parlamento fragiliza, se a imprensa se curva e se a Justiça se isola, o que resta ao cidadão?

Desejo que esta reflexão encontre espaço em sua coluna e veículo, que ainda acredito ser um bastião da liberdade crítica e do pensamento democrático — independentemente de ideologias ou interesses.

Com respeito e esperança de dias mais justos,

N.B. (O leitor e colaborador pediu que o seu nome não fosse divulgado).

  • Por Rogério Bonato

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