Estudantes da UNILA criam nanocorpo para bloquear dengue no mosquito transmissor
Um grupo de 21 estudantes do curso de Biotecnologia da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA), em Foz do Iguaçu, está desenvolvendo uma proposta inovadora para interromper a cadeia de transmissão da dengue diretamente no vetor da doença, o mosquito Aedes aegypti. A estratégia usa ferramentas de biologia sintética para construir nanocorpos, estruturas proteicas capazes de neutralizar o vírus ainda no interior do inseto, impedindo sua propagação.
A pesquisa será apresentada na International Genetically Engineered Machine (iGEM), maior competição do mundo dedicada à engenharia genética e à biologia sintética, marcada para ocorrer neste ano com a participação de 400 equipes de diversos países. Para participar presencialmente do evento e disputar medalhas, os estudantes ainda precisam arrecadar cerca de 3 mil dólares. A equipe conta com o apoio da Itaipu Parquetec, mas também lançou uma campanha de financiamento coletivo para cobrir os custos restantes.
O nanocorpo, uma versão reduzida e mais estável dos anticorpos tradicionais, é desenhado para se acoplar exatamente na região onde o vírus da dengue interage com as células do estômago do Aedes aegypti. A expectativa é que essa barreira física impeça o vírus de infectar o mosquito e se multiplicar.
“Na natureza, as coisas acontecem por interações físicas, ou seja, contato físico. O vírus entra no corpo do mosquito por uma interação muito simples. Ele tem uma proteína que se encaixa perfeitamente nas células do estômago do mosquito. A partir daí, pode ingressar e começar a se multiplicar. Os nanocorpos vão agir nessa região específica de contato entre a proteína do vírus e as células do Aedes”, explica o professor Cristian Rojas, orientador da equipe. “É como tapar uma fechadura com uma massa para impedir que a chave entre e abra a porta”, compara.
O processo para identificar o nanocorpo ideal começou com uma extensa pesquisa em bancos de dados de anticorpos humanos capazes de reconhecer a proteína viral. “Depois a gente obteve a estrutura tridimensional da proteína do vírus que foi colocada junto com o anticorpo humano para saber quais partes interagem e conseguem neutralizar”, conta o estudante Luis Eduardo Figueroa Ribera, que liderou essa fase.
Na etapa seguinte, os estudantes sintetizaram o DNA com a sequência do nanocorpo e o inseriram em uma bactéria do tipo Escherichia coli, uma das mais utilizadas em engenharia genética. A E. coli funciona como uma biofábrica, reproduzindo a proteína desejada em laboratório. “Com as instruções corretas, a bactéria vai fazer a proteína que se deseja”, explica Rojas.
Com o nanocorpo produzido, a terceira fase do estudo busca demonstrar a capacidade de ligação entre a proteína viral e o nanocorpo. Se confirmada, outra bactéria entra em cena: a Serratia marcescens, que habita naturalmente o intestino do mosquito e será modificada para produzir e transmitir os nanocorpos às futuras gerações do Aedes aegypti. O objetivo é criar um mecanismo autossustentável de combate ao vírus da dengue, sem a necessidade de reaplicações constantes.
A pesquisa também leva em consideração aspectos de biossegurança, com o desenvolvimento de mecanismos para evitar que a bactéria modificada escape para o ambiente. “Estou pesquisando vários métodos para criar a biocontenção”, afirma o estudante Sebastian Marquez Sanchez, responsável por essa etapa.
Coordenadora da equipe, a estudante Maria Eduarda Catalan destaca que o projeto sobre a dengue é apenas um dos trabalhos conduzidos pelo Clube de Biologia Sintética Synfronteras, criado dentro da universidade. “Tínhamos vários projetos, a gente escolheu o da dengue para seguir e já está com vários projetos derivados deste e várias ideias”, relata.
Entre os desdobramentos em andamento está o desenvolvimento de um antiviral baseado nos mesmos nanocorpos, mas voltado para uso em humanos. “Utilizei outra ferramenta para ‘humanizar’ esse nanocorpo que a gente está fazendo. Essa humanização refere-se a um aprimoramento da sequência para que ela seja o mais parecida possível com a sequência de um anticorpo humano”, diz Luis. “Isso impediria que o corpo humano reconhecesse esses nanocorpos como alguma coisa estranha e gerasse anticorpos contra ele.”
Outra aplicação em estudo é a criação de kits de diagnóstico baseados na técnica Elisa, usada para identificar substâncias em amostras biológicas. A ideia é substituir os anticorpos tradicionais pelos nanocorpos, reduzindo custos e ampliando o acesso ao diagnóstico da dengue. “Com sorte até o final do ano a gente já estaria com uma patente”, afirma o estudante.
Professor Cristian Rojas reconhece que o uso clínico dos nanocorpos em humanos envolve uma cadeia mais longa de pesquisas e regulamentações, mas acredita no potencial do trabalho. “É muito mais complexo porque aponta a um tratamento clínico. Se esse projeto sair do papel, vai ser um processo mais longo, mas é super importante”, afirma.
- Da redação com UNILA
- Foto: UNILA