Recuperação e soltura de animais silvestres contribuem com a preservação de espécies na região
Primeiro foi o cachorro-do-mato (Cerdocyon thous). Desconfiado, ele demorou quase quatro minutos para deixar a segurança da caixa de madeira e voltar para a mata. Depois, foi a vez do falcão-relógio (Micrastur semitorquatus). Mais decidida, a ave logo deu dois passos para frente e levantou voo, fez uma curva e foi se empoleirar no galho de uma árvore ali por perto. Assim foi a soltura desses dois animais, nesta semana, em áreas florestais da região, coordenada por profissionais da Divisão de Áreas Protegidas da Itaipu.
“É o momento mais gratificante da nossa profissão, porque devolver um animal para a natureza significa o fechamento de um ciclo”, afirmou o biólogo Marcos de Oliveira, um dos responsáveis pela soltura. “A gente recebe o animal que estava ‘morto’ para a natureza, consegue recuperar esse indivíduo e depois soltar em boas condições para a vida livre novamente.”
O biólogo lembra que, até a soltura, foram dois meses de intenso tratamento no setor veterinário do Refúgio Biológico Bela Vista (RBV), para deixá-los prontos para voltarem ao seu ambiente natural. Ele explica que, por serem animais adultos, a ave e o cachorro já sabem como caçar ou se virar na natureza. A preocupação é que a ave tenha condições plenas de voo e o cachorro consiga se orientar, esteja com boa visão e condição física.
No dia da soltura, os animais receberam uma alimentação reforçada, uma forma de prevenção caso demorassem para encontrar uma presa nos primeiros dias de vida livre. Eles foram transportados em caixas de madeira, que foram abertas com cuidado, mantendo distância do animal. O cachorro-do-mato foi levado à Vila Vitorassi, zona rural de Santa Terezinha de Itaipu, onde foi encontrado originalmente. O gavião-relógio, encontrado em área urbana, foi solto próximo ao Parque Nacional do Iguaçu.
“Esses animais são importantes na natureza porque têm uma função ecológica. Ambos são predadores e controlam a população de suas presas, por exemplo, morcegos e pombos. Além disso, o cachorro-do-mato tem a função de disseminador de sementes, ajudando a recompor a vegetação local”, afirmou Marcos de Oliveira.
A soltura dos animais em áreas protegidas é mais uma das várias ações de conservação da fauna e da flora promovidas pelos profissionais lotados no RBV. A Itaipu tem, no Brasil e no Paraguai, dez refúgios biológicos, como o Bela Vista, que em 2024 completam 40 anos de intenso trabalho de preservação da natureza.
Dois meses de tratamento
O falcão-relógio foi encontrado no dia 14 de março, caído no chão na área urbana de Foz do Iguaçu, com um ferimento na cabeça. Na chegada ao Refúgio, a ave apresentava sinais de trauma. Já o cachorro-do-mato foi atropelado e estava inconsciente quando foi encontrado na Vila Vitorassi. Ele chegou no RBV no dia 30 de março, apresentando sinais de traumatismo na região da cabeça e ferimentos superficiais em uma das patas.
Segundo a médica-veterinária Aline Konell, o cachorro chegou quase em estado de coma. Foram feitos todos os procedimentos para verificar respiração e frequência cardíaca. Depois, avaliaram por radiografia se havia alguma fratura e ele foi medicado. “Apesar de, no início, ele apresentar alguns problemas neurológicos, como andar cambaleante e um pouco de dificuldade para se movimentar, aos poucos ele foi recuperando a visão e os movimentos, até apresentar o comportamento normal de um cachorro-do-mato”, conta.
Sobre o falcão, Aline explica que são comuns atropelamentos de aves, porque elas ficam com dificuldade para enxergar devido às luzes da cidade. Também foi feito o procedimento para avaliar os sinais vitais e verificar possíveis fraturas. A ave ficou mais tempo no RBV, enquanto ganhava firmeza no voo. Para isso, foi solta em um longo corredor, onde podia praticar. “A gente avaliou se ele conseguia levantar voo, manter o voo por um tempo, se conseguia planar e, finalmente, pousar”, resume Aline.
De acordo com ela, sempre que alguém encontra um animal ferido, é recomendado procurar os órgãos ambientais, como o Instituto Água e Terra, a Polícia Florestal, a Polícia Ambiental ou o Corpo de Bombeiros. As pessoas não devem ser aproximar ou tocar os animais quando forem espécies mais agressivas, como cachorro-do-mato ou onça-parda. Se for um animal menor, como uma ave, pode recolher em uma caixa e fazer a entrega em um dos órgãos.
Falcão-relógio (Micrastur semitorquatus)
O falcão-relógio é uma ave de rapina de porte médio, da família Falconidae, da Ordem dos Falconiformes, também conhecido como gavião-da-mata ou taguató (Argentina). É um exímio caçador de ambientes florestais em ambientes com pouca luz, tem excelente audição e aproveita de suas patas compridas para alcançar ocos de árvores e ninhos de aves até maiores do que ele. Também caça pequenos mamíferos, cobras e lagartos.
Cachorro-do-mato (Cerdocyon thous)
O cachorro-do-mato, também conhecido como graxaim-do-mato pelos gaúchos, é uma espécie de canídeo endêmico da América do Sul, muito comum no Brasil. Comumente é visto em áreas de campo e próximo de áreas urbanas. Quando passam em estradas podem ser vítimas de atropelamento, principalmente à noite, por ficarem confusos com as luzes dos veículos.
- Imprensa de Itaipu / Foto: Sara Cheida / Itaipu Binacional