Coluna do Corvo
Enfim, o Tio Sam vai conhecer a nossa batucada
“Brasil, esquentai vossos pandeiros, iluminai os terreiros que nós queremos sambar!”. O tal do tarifaço é uma fanfarronice protecionista — de mau gosto e pouca lógica. Mostra, mais uma vez, o que já sabíamos: os norte-americanos pouco conhecem o mundo além do próprio umbigo. Agem conforme seus interesses, com arrogância pontual. O Brasil que tire lições disso. E veja só a petulância: mais de 700 itens, os que realmente interessam a eles, ficaram de fora. Sobretaxa seletiva. É como um magnata entrar no armazém e pedir fiado na cesta básica do turco. Barbaridade!
Será que os brasileiros entenderam?
Muita gente ainda boia no caldo do tarifaço, sem sacar por que Donald Trump fez beicinho e armou essa presepada contra seu ex-aliado dos trópicos. Mas quem entende de geopolítica econômica já ligou os pontos: a trama é esfarrapada, puro diversionismo. Trump, oportunista contumaz, viu brecha para empurrar o Brasil para fora da zona de conforto nas negociações bilaterais. E, pasmem, teve ajuda interna: Eduardo Bolsonaro, com sua diplomacia de boteco, alimentou as ilusões do gringo e espetou uma bela faca nas costas dos conterrâneos. Bravíssimo, deputado!
A farsa, a birra e a barrigada
Para Donald Trump, o tarifaço se justifica por uma suposta “caça às bruxas” contra Jair Bolsonaro e por decisões do STF que atingem empresas americanas, como o X (antigo Twitter). Alexandre de Moraes virou, portanto, inimigo número um da liberdade made in USA. Trump ainda defende que Bolsonaro foi “um líder altamente respeitado no mundo”. Aonde, criatura? A julgar pela fila de chefes de Estado que respiraram aliviados e prestigiaram a posse de Lula, esse prestígio é folclore de palanque. O Brasil seria, segundo ele, uma “vergonha internacional”. Mas o que o mundo espera — e exige — é Justiça. Nem que doa nos comparsas.
Xandão & amigos ao velho mundo!
Alexandre de Moraes e outros ministros do STF agora figuram na lista de personas non gratas nos Estados Unidos, por obra do seo Trump. Será que estão tristonhos? Duvido. Quem pode circular por Paris, Roma, Londres ou Madri dificilmente sentirá falta de um churrasco texano. Para eles, o velho mundo continua aberto e elegante. Já a deputada licenciada Carla Zambelli, envolvida até o pescoço em pendengas jurídicas e com passaporte cada vez mais restrito, apesar da dupla cidadania, talvez sinta mais falta da Disneylândia. O mundo gira — e, às vezes, roda.
O café fora da caneca
No meio do salseiro geopolítico, o café brasileiro amargou um gosto estranho. Ficou de fora da lista de exceções do tarifaço e isso não é por acaso. Os EUA querem melhorar a compra do produto com a Colômbia e o Vietnã, grandes produtores globais. Em 2024, o Brasil exportou quase US$ 2 bilhões da bebida para os americanos — 16,7% do nosso total. Com a nova alíquota de 50%, o setor nacional sofrerá perdas, mas o consumidor norte-americano sentirá o baque no bolso. Quem diria o cafezinho agora virou arma comercial.
Os bois mugindo
Os EUA são o segundo maior mercado para a carne bovina brasileira. Mas são ainda os maiores criadores. Adoram uma bisteca até no café da manhã. Em 2024, o Brasil exportou 532 mil toneladas, com receita de US$ 1,6 bilhão. A nova tarifa poderá reduzir em até 5% a receita líquida dos produtores. Os americanos vão aumentar os negócios com a Austrália, Argentina e Índia. O efeito sobre o setor brasileiro será significativo, empresas como a JBS e Marfrig sofrerão, mas poderão aumentar o fornecimento em outros continentes, fazendo a fila de interessados andar. A carne brasileira sempre foi muito disputada.
No chapéu da Carmen Miranda
Em 2023, o Brasil exportou mais de 1 milhão de toneladas em frutas — e agora parte dessa salada mista vai azedar nos Estados Unidos. O tarifaço atinge diretamente 36,8 mil toneladas de manga, 18,8 mil de frutas processadas (como o açaí), 13,8 mil de uva e 7,6 mil de outras variedades. O custo extra ameaça a competitividade no mercado americano. Dizem que os consumidores já ensaiam uma gritaria, porque nossos pomares fornecem o que o mundo não cultiva. Não por acaso, a União Europeia já acusou o Brasil de fazer “monopólio frutífero” nos EUA. Pode ser o fim do reinado tropical no chapéu da “pequena notável”.
Os bois mugindo
Os EUA são o segundo maior mercado para a carne bovina brasileira — e, ao mesmo tempo, os maiores criadores do mundo. Amam uma bisteca até no café da manhã. Em 2024, o Brasil embarcou 532 mil toneladas de carne para lá, faturando US$ 1,6 bilhão. Com a nova tarifa, estima-se queda de até 5% na receita líquida dos produtores nacionais. Os americanos já se mexem para importar mais de Austrália, Argentina e Índia. O baque será sentido por gigantes como JBS e Marfrig, mas o mercado é ágil: novas portas se abrem em outros continentes. A fila anda — e a carne brasileira segue sendo a mais cobiçada do churrasco global.
O Brasil terá que usar suas camisetas
A indústria têxtil brasileira, que já anda descosturada pela concorrência internacional, levou mais um puxão de linha com o tarifaço. Sem isenção ampla, o setor será diretamente atingido — restaram de fora apenas itens exóticos, como fios de sisal para enfardamento e produtos para aeronaves civis. Nada que aqueça o mercado de vestuário nacional. A mensagem foi clara: ou o Brasil veste sua própria camisa, ou ficará sem tecido para manter a economia aquecida.
Sem o pé de chinelo… de borracha
Deram uma pisada forte sobre os calçados brasileiros, que não entraram em nenhuma exceção e agora encaram a tarifa cheia. Para um setor que tem nos EUA um de seus principais mercados, o impacto será direto: queda nas vendas e estoques encalhados. Resta torcer para que, no mercado interno, isso derrube um pouco o preço das legítimas Havaianas e empurre para fora as imitações duvidosas. Este colunista, aliás, já sofreu escorregões homéricos com chinelo fajuto. Se o efeito colateral for chinelo ruim e barato no supermercado, que venha o tarifaço…
Móveis só se for com asas
Entre os poucos privilegiados pelo tarifaço, os “artigos de aeronaves civis” passaram ilesos. Poltronas de avião, móveis plásticos e metálicos para voos tranquilos escaparam. Mas o bom e velho sofá brasileiro, de madeira e espuma, esse vai ter que procurar freguesia noutro quintal. As grandes exportadoras nacionais – em todos os segmentos – já buscam alternativas para não provocar demissões em cadeia — e há quem esteja lotando hotéis em Brasília, tentando entender qual será a estratégia de salvaguarda. Afinal, são essas empresas que mantêm empregos, pagam tributos e movem a economia. Se o Brasil souber aproveitar as brechas — e parar de só lamber feridas — talvez até saia maior dessa turbulência.
Aviões brasileiros são bons e competitivos
Nem tudo foi turbulência no tarifaço. A indústria aeronáutica brasileira, reconhecidamente de ponta, escapou da sobretaxa. A isenção concedida pelos EUA cobre desde aeronaves completas até peças, motores e simuladores de voo. Afinal, isso o Brasil faz — e faz bem, obrigado. Empresas como a Embraer respiram aliviadas, assim como toda a cadeia de fornecedores que atende montadoras e companhias aéreas norte-americanas. O gesto evita a ruptura de contratos internacionais e preserva empregos altamente qualificados. Nesse voo, não pagamos mico — e ainda mostramos que temos asa própria. Afinal, acreditamos que o avião é uma invenção nossa. Ou melhor, do Santos-Dumont.
Americanos adoram os nossos carros
Nem só de tarifas vive a birra do Tio Sam. Veículos de passageiros made in Brazil — sedans, SUVs, minivans e até caminhões leves — ficaram de fora do tarifaço. Também escaparam as peças e componentes, essenciais à indústria de autopeças. Motivo? Os gringos gostam mesmo dos nossos carros. A medida preserva a competitividade das montadoras instaladas no Brasil, que mantêm exportações firmes rumo ao hemisfério norte. Nesse caso, o gosto dos consumidores falou mais alto que a retórica protecionista. E ainda há quem diga que o Brasil não tem motor para andar no mercado global.
Energia não pode faltar
Entre tantas retaliações tarifárias, os produtos energéticos escaparam ilesos: carvão, gás natural, petróleo e seus derivados — querosene, parafina, óleos lubrificantes, betume, coque e até a energia elétrica. Nada disso entrou na tesoura do Trump. Vai ver o ex-presidente está cogitando puxar um “gato” na linha de Itaipu… Brincadeiras à parte, a isenção evita distorções num setor estratégico para a balança comercial brasileira. Energia é insumo vital, e mexer nisso poderia provocar apagões, inclusive os diplomáticos. Pelo menos nesse ponto, os gringos souberam respeitar a voltagem.
Ah, o agronegócio!
O agronegócio brasileiro, sempre resiliente, foi atingido de forma seletiva pelo tarifaço. Alguns produtos escaparam da pancada: suco e polpa de laranja, castanha-do-brasil, mica bruta, madeira tropical e polpa de celulose. Até aí, tudo bem. Mas o alívio real veio com a isenção de fertilizantes amplamente usados nas lavouras nacionais — medida que ajuda a conter os custos no campo e evita um colapso em cadeia. Ou seja: onde os interesses convergiram, os gringos pegaram leve. E o agro, que é pop, forte e tudo mais, segue girando com cautela, mas sem sair dos trilhos.
Mineração interessa a eles, e muito
Se tem algo que os norte-americanos não querem perder de vista é a mineração brasileira. Produtos como silício, ferro-gusa, alumina, estanho, ouro, prata, ferroníquel e ferronióbio foram poupados do tarifaço. Também escaparam itens semiacabados e componentes industriais de ferro, aço, alumínio e cobre. O recado é claro: quando se trata de matéria-prima estratégica, não há espaço para bravata. O subsolo do Brasil continua sendo de interesse vital para os gringos, que sabem muito bem onde pisam quando o assunto é cadeia produtiva e insumo industrial. Nosso solo é muito rico.
Eletrônicos & outros
Smartphones, antenas e aparelhos de som e vídeo escaparam do tarifaço. É aí que o Brasil entra na equação estratégica dos EUA para conter a influência asiática. Também ficaram de fora bens em trânsito, produtos enviados para reparo, mercadorias já a caminho antes da medida, donativos e itens de uso pessoal — livros, filmes, CDs, obras de arte. Parece generoso, mas é pragmatismo puro. A verdade? Apesar dessa lista de exceções, a maioria dos produtos brasileiros será, sim, atingida. O pacote de Donald Trump é mais econômico, disfarçado de político — uma birra em forma de imposto.
E a batucada?
Apesar da repercussão global, o Brasil ainda não definiu sua resposta ao tarifaço de Trump. Espera-se que venha da gaveta comercial, com inteligência — e não com frases mofadas como “traidores da pátria” ou outros clichês patrióticos de prateleira. O problema não está no traidor, mas em quem acredita na traição. A novela está só no primeiro capítulo: ainda virão reações no Congresso americano, embates em tribunais internacionais e muito pano para manga. Os EUA estão brigando com meio mundo — e o Brasil precisa aproveitar a brecha com estratégia. A situação é delicada, mas passageira. Como já se disse por aí: nada vence a criatividade dos brasileiros. E, se necessário, usaremos surdo, repinique, cuíca, tamborim e reco-reco. Sem esquecer o pandeiro! Uma boa sexta-feira a todos! Bem-vindo agosto! Mês do cachorro louco!
- Por Rogério Bonato