Coluna do Corvo

A fé não protege do machismo

Em Foz do Iguaçu, terra de peregrinos e templos sagrados, uma estatística profana desafia a dignidade humana: cerca de 1.500 mulheres vivem sob proteção do Estado por sofrerem violência doméstica. Isso representa 1% da população — mulheres acuadas pelo medo dentro de suas próprias casas. São 100 pedidos mensais de medidas protetivas, mais de três por dia útil, além de 20 registros diários de agressão. O agressor? Geralmente o companheiro, o pai dos filhos, o homem com quem dividem o teto. A fé pode mover montanhas, mas ainda não move o machismo entranhado nos lares. Essa violência rotineira é a mais covarde das guerras, silenciosa e devastadora.

 

Patrulha, tornozeleira e esperança

Há quem ache exagero, mas a urgência justifica o investimento: o Paraná avança com o uso de tornozeleiras eletrônicas para monitorar agressores e proteger vítimas. Foz do Iguaçu, após Curitiba, será cidade-piloto de um programa de R$ 4,8 milhões que tenta dar às mulheres aquilo que o Estado sempre lhes deveu: tempo para sobreviver. A Patrulha Maria da Penha é a linha de frente, com visitas regulares, acolhimento e humanidade. Funciona. Mas seria ingênuo acreditar que isso resolve a origem do problema. A tornozeleira segura o monstro, mas não o transforma. A mudança que importa é aquela que ainda não começa: a dos valores de uma sociedade que forma homens para dominar, e não para conviver.

 

O Brasil no espelho da vergonha

Os números de Foz do Iguaçu escancaram um drama local, mas é o retrato de um país inteiro que se vê no espelho trincado da violência de gênero. Em 2023, o Brasil registrou mais de 1.400 feminicídios. São quase quatro mulheres assassinadas por dia, pelo simples fato de serem mulheres. A cada dois minutos, uma sofre agressão física. Isso nos coloca entre os países mais inseguros das Américas para o público feminino. É um vexame que muitos insistem em relativizar. Não é exagero, não é problema doméstico, nem “briga de casal”: é crime! E deve ser tratado com a força de uma política de Estado — que una proteção, justiça, reeducação e uma mudança cultural profunda. Sem isso, continuaremos nos afogando em estatísticas que sangram.

 

Um bom aliado, ora pois!

Entre os senadores que ainda lembram que Foz do Iguaçu existe, Sérgio Moro vem ganhando pontos — ou, no mínimo, milhas de prestígio. Comparado a Flávio Arns, que sumiu no mapa, e Oriovisto Guimarães, que só foi “visto” em campanha, Moro é praticamente cidadão iguaçuense. Só falta algum vereador sugerir o título. Desde os tempos de juiz justiceiro com crachá da República de Curitiba até o terno mais sóbrio de Brasília, ele estreitou laços com a cidade. Agora, como senador, articula com a ACIFI – pela terceira vez – sobre desenvolvimento econômico. No âmbito político, até podem discordar de seus métodos ou ideias, mas é inegável: entre os que prometem e os que aparecem, Moro tem sido figura constante — e isso, em política, vale voto.

 

Giro, contas e plateia

Na próxima segunda, Sergio Moro retorna à ACIFI para mais uma agenda que mistura prestação de contas com política em ritmo de recesso — e, claro, bons registros para redes sociais. A reunião é aberta, promete debates sobre o futuro de Foz e, quem sabe, uma selfie com empresários e lideranças civis. Ele diz que está rodando o Paraná inteiro — são mais de 30 cidades no roteiro —, mas Foz parece ter lugar cativo. Afinal, ele já colheu propostas por aqui, comentou reforma tributária e agora volta com ares de “senador da fronteira”. Que seja bem-vindo!

 

Perimetral em fase de “reza forte”

Depois de um tempão como lenda urbana, a Perimetral Leste finalmente começa a parecer obra de verdade. Com quase 80% do asfalto e 100% dos viadutos finalizados, já dá até para sonhar com caminhões longe do centro e bairros. Mas como bons iguaçuenses sabem, entre prometer e entregar há um terreno pantanoso — literalmente. Basta chover três dias acima da média para o cronograma entrar em estado de alerta e escavações virarem piscina olímpica. A torcida é para que o clima colabore, os engenheiros mantenham o ritmo e São Pedro não resolva testar a drenagem dos pátios das novas aduanas.

 

Asfalto na pista, aposta no céu

O Governo do Paraná garante: a obra da Perimetral vai até novembro. Mas o povo de Foz já aprendeu a fazer check-in no calendário com lápis e borracha. O avanço é real, o progresso é visível, mas paira no ar a dúvida de quem já viu muita promessa virar poça: a cada nuvem carregada, um fiscal do cronograma morde a tampa da caneta. As novas aduanas estão lindas, maiores que shopping center e mais organizadas que muita repartição federal. O investimento é gigante, o impacto será histórico, mas só a meteorologia vai dizer se essa novela termina… ou vai ganhar mais uma temporada.

 

Canteiro de futuro

As obras estruturantes de Foz do Iguaçu não estão apenas mudando o tráfego — estão redesenhando a cidade. A região Sul, de tanto levantar poeira e engolir brita, já parece outro município. A linha de transformação vem desde os corredores turísticos e avança até a BR-277, numa conexão que mexe com a geografia urbana e, quem sabe, até com a toponímia: com as chuvas recentes, o bairro Três Lagoas já está quase se candidatando a Seis! É claro que obras incomodam. Mas quando ficam prontas, são um colírio urbanístico — a gente até esquece a dor de cabeça. Este colunista, que cresceu em São Bernardo do Campo nos tempos de mutações contínuas da Via Anchieta, aprendeu a conviver com desvios, britas e mapas novos. Até hoje, para visitar a dona Gina — minha mãezinha de 89 anos —, preciso me atualizar sobre os acessos. Daí vem essa paciência quase zen com as obras aqui no Jardim Buenos Aires, epicentro do progresso decorado pelo barro.

 

O dólar é quem manda

Em Foz do Iguaçu, o dólar não é só uma moeda: é termômetro de humor, de fluxo e, para muitos, até guia espiritual. As oscilações cambiais interferem diretamente no movimento da cidade e de suas irmãs fronteiriças. Quando o dólar cai, turistas argentinos e paraguaios brotam como flores dos ipês em setembro. Quando sobe, é o brasileiro quem atravessa a ponte em busca de oportunidades, ou entopem os free shops. Operadores de turismo fazem previsões e montam grupos de excursão com base nas cotações, muitas vezes com mais precisão que meteorologista prevendo frente fria. Por aqui, não se consulta só o tempo — consulta-se o câmbio.

 

Dólar do dia, azedume na boca

A economia da fronteira é tão sensível ao dólar quanto a lavoura à geada. Já aconteceu mais de uma vez: o turista sai feliz de São Paulo ou Porto Alegre com o dólar baixo e, ao pisar em Foz, a cotação amanhece nas alturas. Pronto, é o suficiente para azedar o humor e esvaziar o carrinho de compras. A frustração é histórica e cíclica. Quem trabalha no setor já aprendeu: mais importante que o clima ou o trânsito, é o câmbio do dia. Em Foz, dólar alto segura consumo, dólar baixo enche hotéis e o comércio. E assim seguimos, com a fronteira oscilando ao ritmo do Tio Sam — e o comerciante local, torcendo por estabilidade e câmbio camarada.

 

Visões além do retrovisor

Tem leitor achando que esta coluna foi treinada em Hogwarts: basta falar em eleição que já surgem mensagens perguntando quem vai vencer, perder ou desaparecer do mapa. A verdade é que o acerto sobre a vitória de Silva e Luna foi menos mágica e mais análise de campo — ou de asfalto. A renovação da Câmara também não caiu do céu: era previsível, diante do cansaço com a legislatura anterior, que colecionava reclamações. Agora, com 2026 à vista, a mesma bola de cristal empoeirada só mostra uma palavra: neblina. Ainda não há cenário formado.

 

Efeito rebote das urnas

Acertar resultado de eleição em Foz não é para amadores — é para quem tem memória, paciência e estômago. O fenômeno Silva e Luna se explica: o desgaste de Paulo Mac já vinha dando sinais, a onda bolsonarista ainda surfava na crista e o eleitor não aceitou colar o ex-prefeito nela. Foi como prever chuva em dia de nuvem preta. A margem de vitória foi maior do que se imaginava, sim, mas o acerto no nome vencedor ainda reverbera por aí. Agora, com a política nacional em parafuso — Trump causando tarifaço, Bolsonaro entre tornozeleiras e censuras, e Lula tentando segurar a popularidade —, tudo pode acontecer. Inclusive nada. Quem viver, especule.

 

A dança dos nomes

Basta esquentar o clima pré-eleitoral para começar o baile dos pretendentes aos tronos de representantes. Nomes como Aírton José e Deoclécio Duarte ainda não saíram do consciente eleitoral; deputados em ação como Vermelho, Giacobo e Matheus — e uma Câmara Municipal que mais parece pista de decolagem: dos 15 vereadores, ao menos 7 querem voar mais alto, surgem a todo momento nas discussões políticas. O problema é que todos querem pilotar, e poucos estão0 checando as condições do avião. Foz do Iguaçu continua refém da velha prática: cidade estratégica, cheia de problemas, alguns complexos, e, ainda assim oferecendo espaço para aventureiros de fora pescarem votos como se aqui fosse aquário de eleição.

 

O tempo, esse velho marqueteiro

Enquanto os bastidores fervem, há um nome que não entra em pré-campanha, mas manda no resultado final: o tempo. Ele será o verdadeiro senhor das definições eleitorais. Até lá, veremos gente se lançando, se recolhendo, se reinventando; e figuras como Paulo Mac, que não quer saber de ser deputado, mas ainda vê a cadeira de prefeito com aquele brilho no olhar. Crescem os comentários que o governador Ratinho Júnior poderá arriscar a dança nacional — num cenário onde Lula e Bolsonaro já estão com as pedras de rebolo gastas. O povo, esse sim, ainda está calibrando o radar. Porque no final, não ganha quem fala mais — ganha quem convence na hora certa. Passará muita água embaixo das três pontes, até o cenário clarear de verdade.

 

  • Por Rogério Bonato

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