Coluna do Corvo

Vamos pensar?

Os sábados – e especialmente os fins de semana prolongados – foram feitos para pensar. Mas não em política, por favor! Vamos dar um descanso às rusgas partidárias, aos bastidores cabeludos e às pesquisas eleitorais que mais confundem do que explicam. É hora de fazer uma higienização no otimismo, passar álcool gel nas ideias e arejar o pensamento com um pouco de leveza. Troquemos os conchavos por causos, as tretas por trocadilhos. Vamos olhar pra frente, rir do que der, duvidar do resto e acolher as deliciosas casualidades sabatinas. Afinal, até a urna precisa de um fim de semana para respirar.

 

Nasce um precedente (ou quase):

Quem diria o bebê reborn entrou no RH! Barbaridade! O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região acaba de registrar um dos processos mais inusitados de todos os tempos: uma recepcionista de Salvador pede rescisão indireta, danos morais e licença-maternidade por ter sido impedida de usufruir dos direitos trabalhistas relacionados à sua filha… reborn. Sim, a boneca hiper-realista chamada Olívia. A funcionária alega maternidade afetiva, escárnio patronal e trauma emocional. A empresa retrucou com deboche. Deveriam pensar antes. A Justiça agora precisa decidir se o afeto, mesmo em silicone, gera direito líquido e certo — ou será apenas meme de tribunal.

 

Eis um novo dilema do Direito

Cordão umbilical ou barbante emocional? A tese da maternidade afetiva aplicada a bebês reborn pode até parecer ridícula, mas está agora no Fórum, em Salvador. Com base no artigo 1º, III, da Constituição e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a defesa argumenta que “mãe é quem cuida”. O problema: o ECA não trata de objetos fabricados em vinil siliconado. Embora o Direito de Família já reconheça vínculos socioafetivos, a CLT ainda exige que o “dependente” tenha CPF, vacina e, pelo menos, temperatura corporal.

 

O Judiciário vira berçário?

Licença-maternidade para bonecas já! Se a moda pega, os departamentos de Recursos Humanos do país terão que adaptar suas normas. Em vez de atestado médico, o que vale? Certidão de nascimento emitida por loja de brinquedo importado? Registro em cartório do afeto? Embora a ação de Maira Leite não seja a primeira a tocar em vínculos não biológicos (vide casos de adoção homoafetiva ou multiparentalidade), esta é a primeira onde a criança não chora por causa da chupeta, não cresce e nem frequentará o pediatra. Mas, justiça seja feita, virose de creche também gruda em boneca.

 

Imobiliária tropeçou na sensibilidade emocional

A empresa de administração e negócios imobiliários, alvo da ação, foi acusada de zombar da maternidade afetiva da funcionária. Teria dito que ela precisava de “psiquiatra, não de benefício”. O caso revela não só despreparo para lidar com a diversidade de afetos no mundo contemporâneo, mas uma completa ausência de filtro corporativo. A sentença poderá custar R$ 40 mil, além de entrar para os anais do Judiciário como mais uma prova de que RH não é lugar para julgamento moral — é para cumprimento de normas, mesmo quando a norma é incomum.

 

Quando o afeto desafia a CLT

Em 2019, uma servidora pública de São Paulo ganhou na Justiça o direito de usufruir licença para cuidar de um cão com câncer terminal, com base na tese de “família multiespécie”. Em 2022, uma mãe adotiva de criança informal conseguiu estender sua licença-maternidade por meio de liminar. O caso da boneca reborn amplia essa trilha jurídica: e se o vínculo for 100% emocional e simbólico? A Justiça terá que decidir se afeto basta — ou se é necessário ao menos um RG com impressão digital e fralda suja no histórico.

 

A Justiça como espelho da sociedade

Vivemos uma crise de realidade. O caso da bebê Olívia reborn é mais que um processo curioso: é um espelho cultural. Em tempos de vínculos líquidos, subjetividades infladas e redes sociais convertidas em confessionários coletivos, o Direito é convocado a lidar com o que, até pouco tempo atrás, era tratado como fantasia. A pergunta de fundo é perturbadora: se o afeto é real, deve ser reconhecido juridicamente, mesmo que o objeto amado seja uma boneca? A CLT nasceu nos anos 1940. Em 2025, ela precisa decidir se há espaço para reformar em nome da evolução.

 

Crime passional de silicone?

O amor anda tão moderno que já tem gente perdendo a cabeça por bonecos que… nem cabeça têm mais. Em Manaus, uma mulher que se sentia “enganada emocionalmente” por seu boneco realista o decapitou com a faca de cortar pão. Não houve flagrante nem boletim. A polícia alegou que faltou vítima com RG. Já há juristas discutindo se o afeto com bonecos pode gerar danos morais. Se existe boneca reborn recebendo até pensão, por que o Ken de silicone não renderia um B.O.?

 

Maria da Penha versão 2.0?

Juristas andam se coçando: e se o sujeito espancar sua parceira de silicone após ouvir dela — via chip — que ele está emocionalmente indisponível? A Lei Maria da Penha exige pessoa real como vítima, mas no campo da jurisprudência afetiva, o buraco é mais embaixo (pode ser recarregável por USB). O que antes era brinquedo agora vira parceiro, conselheiro e, quem diria, pivô de briga judicial. Já tem delegacia recebendo queixa de ciúme envolvendo inteligência artificial.

 

“Terminei com o boneco, mas ele não saiu de casa”

Em São Paulo, uma mulher quis expulsar o ex-companheiro — um robô afetivo de última geração — de seu apartamento. Alegou que o boneco “ocupava espaço emocional e físico”. O juiz arquivou o caso, mas recomendou terapia. Se já há decisões garantindo guarda compartilhada de pets e bonecas reborn, o próximo passo pode ser partilha de IA sentimental. Atenção: em breve, robôs poderão pedir medida protetiva contra humanos impulsivos.

 

Manual de Convivência Humano-Sintético

Com bonecos que falam, choram e aconselham, não falta quem os veja como parceiros de verdade — até que uma briga doméstica vire caso de polícia. Ainda não há precedente judicial em que uma boneca processou por danos físicos, mas o STJ já reconheceu o valor emocional de objetos com carga afetiva. O afeto, antes coisa de gente, agora está sendo terceirizado para o plástico. E prepare-se: o Código Civil pode precisar de anexo só para “relacionamentos eletroafetivos”.

 

Ficção, só se for da vida real

O cinema andou tropeçando nas previsões: 2001 – Uma Odisseia no Espaço previa um futuro intergaláctico, mas o que tivemos foram rojões de São João (além da pisada na Lua). Blade Runner achou que 2019 seria povoado por andróides quase humanos — mal sabiam que nem o robô aspirador daria conta de subir no tapete. Mas a ficção nunca previu o mais bizarro: o afeto real por bonecos de silicone, com ciúme e até boletim de ocorrência. Hollywood errou no cenário, mas acertou no absurdo. Está aí um bom roteiro: Amor em Plástico Duro — e o Código Penal que lute.

 

A fé no frete grátis

Mudando de assunto: enquanto até o papa se preocupa com a IA e o Dalai Lama medita sobre a ética digital, o real milagre moderno se chama “frete grátis em 7 dias úteis”. A nova religião do consumo tem altar em apps como Shopee e Amazon, onde o fiel não reza, mas rastreia. Só que essa fé tem efeitos colaterais: cada clique é um tijolo a menos no comércio da esquina, e o apocalipse do varejo físico já bate ponto. Se o dízimo antes ia para o armazém da Dona Lourdes, agora financia um armazém em Guangdong. O problema é que, se todo mundo perder o emprego, nem cashback salvará a fé consumista.

 

O evangelho segundo o algoritmo

Lojas fecham, shoppings viram templos do eco vazio, enquanto o Messias do algoritmo entrega cueca, liquidificador e drone num só pacote. Os profetas do mercado avisaram: “cuidado com a concentração de renda em gigantes digitais”. Mas ninguém ouve quando o vestido custa R$ 39 com cupom. A revolução da conveniência trouxe conforto, sim — mas também uma bomba-relógio social. Quando a classe média sentir dor do desemprego (o comércio é o segmento que mais emprega), quem vai sustentar esse paraíso logístico?

 

Shopee, Shein e o exílio do camelô

Se antes o ambulante driblava a fiscalização vendendo óculos escuros na praça, agora quem precisa se reinventar é o lojista do shopping, que virou um consultor de vitrine vazia. O comércio online democratizou o acesso — e precarizou o ganha-pão. O vendedor que você ignorou na loja agora tenta virar influencer no TikTok. A ironia? Até o camelô foi digitalizado. Mas atenção: quando todo mundo for autônomo de si mesmo, sem cliente e sem CLT, a “black friday” será permanente… só que na geladeira.

 

A roda da fortuna emperra

Economistas adoram falar da “roda da economia girando”, mas não contavam que ela giraria tão rápido que ninguém mais conseguiria segurar o eixo. Com o boom do e-commerce chinês, o pequeno comércio morre sufocado e o emprego formal evapora. Resultado: menos renda, menos consumo, menos tudo. Até os sites de compra vão sentir o baque, pois nem boleto parcelado resiste a salário inexistente. Se o mundo não equilibrar essa gangorra digital, o que hoje é conveniência pode virar colapso. E nem a inteligência artificial vai entregar solução no prazo.

 

Bem-vindo, junho com J de Jaqueta

E não é que junho chegou chegando? E com ele o primeiro fim de semana frio em Foz do Iguaçu — aquele em que o casaco finalmente sai do armário e o quentão vira combustível social. As festas juninas começam a pipocar e o cheiro de pinhão no ar substitui o de repelente. Tem gente que ama o inverno só porque economiza no ar-condicionado, mas esquece que o chuveiro elétrico vai mandar lembranças na conta de luz. No fim das contas, o frio é democrático: esquenta o coração nas quadrilhas e congela os pés nas manhãs. Bom fim de semana a todos — agasalhem-se e aproveitem, porque inverno em Foz dura menos que pamonha em quermesse!

  • Por Rogério Bonato

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